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O paradoxo das coincidências de aniversários José Eduardo Ferreira da Silva & Maria Lúcia Lorenzetti Wodewotzki |
1- 1 - Introdução Embora a palavra paradoxo possua muitos significados, vamos tomá-la, neste artigo, para designar, (cf. Gardner, 1993 p. 9), “(...) quaisquer efeitos de tal modo em contradição com o senso comum e a intuição que provocam uma reação imediata de surpresa e perplexidade.” Especificamente, o problema que iremos tratar refere-se ao cálculo da probabilidade de que, em um grupo de pessoas reunidas ao acaso, pelo menos duas pessoas façam aniversário no mesmo dia do ano. Por exemplo: você sabia que, em média, para cada dez grupos de trinta pessoas reunidas ao acaso, em sete desses grupos há pelo menos duas pessoas cujo aniversário é no mesmo dia? Ou, de modo mais específico, que em um grupo de trinta indivíduos escolhidos aleatoriamente, a probabilidade de que pelo menos duas pessoas façam aniversário no mesmo dia é de, aproximadamente, 70%? Em linhas gerais, trata-se de um fenômeno de alta incidência probabilística, no mínimo, bastante curioso. Afinal, um ano tem, em média, 365 dias! Portanto, um paradoxo, pois se trata de uma afirmação aparentemente falsa, mas que na realidade é verdadeira. Dito isso, passemos ao foco de interesse desse artigo que é apresentar justificativa para esse fato de alta incidência probabilística - de certa forma contra intuitivo - a partir do seguinte exemplo, tomado de Gardner (1993, p. 182, 183): em um grupo de quatro pessoas tomadas ao acaso, qual é a probabilidade de que pelo menos duas delas tenham o mesmo signo zodiacal? |
1- 2 - Uma justificativa sob a ótica da probabilidade condicional Para o desenvolvimento de nossas justificativas vamos tomar por P(C) a probabilidade de que haja pelo menos uma coincidência entre os signos dos quatro indivíduos do grupo e, por P(Cc) o evento complementar de P(C), ou seja, a probabilidade de não ocorrência de coincidências entre os signos das quatro pessoas envolvidas na estória. Pensando sob o ponto de vista do evento complementar, isto é, da perspectiva de que não ocorra coincidência entre os signos, vamos tomar um dos indivíduos do grupo (I1) e supor, para essa pessoa, o signo de Peixes. |
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1- Note, que para o segundo indivíduo (I2) – como o nosso interesse é garantir a não ocorrência de coincidências nos signos – a condição que se impõe é a de que, para este indivíduo, a escolha não seja o signo Peixes. Dito de outra forma, das doze possibilidades de escolha para o signo de (I2) temos, agora, somente onze opções. Portanto, isso nos permite dizer que a probabilidade do signo de (I2) ser diferente do signo de (I1) é de 11/12. Vamos supor, então, que o signo de (I2) seja Aquário. |
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1- Logo, isso significa que o signo do terceiro indivíduo (I3) não pode ser Peixes e nem Aquário. Isto é, a probabilidade de que o signo de (I3) seja diferente dos signos de (I1) e (I2) é 10/12. Suponha, agora, que o signo de (I3) seja Capricórnio. |
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1- Então, a probabilidade do quarto indivíduo (I4) possuir o signo diferente dos signos dos demais membros do grupo é de 9/12. Desse modo, pelo teorema do produto associado ao cálculo das probabilidades condicionais, a probabilidade do evento complementar P(Cc) é |
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1- Contudo, como o que se quer é P(C), ou seja, a probabilidade de que ocorra pelo menos uma coincidência de signos entre duas pessoas do grupo, segue que: |
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1- Posto isto, retornemos ao problema original, ou seja, determinar a probabilidade de que em um grupo de trinta indivíduos reunidos ao acaso, ocorra o fato de que pelo menos duas pessoas façam aniversários no mesmo dia. Note que o problema é análogo ao problema das coincidências dos signos. As diferenças são que, ao invés de 12 signos, temos agora 365 dias e, ao invés de um grupo de quatro pessoas, o grupo agora é composto por trinta pessoas. Portanto, o cálculo de P(Cc) é semelhante, exceto pelo fato de agora teremos 29 frações para multiplicar, ou seja: |
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1- Logo, o valor de P(C), isto é, o valor da probabilidade de que em um grupo de trinta pessoas, pelo menos duas delas aniversariem no mesmo dia, será de 1 – 0,293 = 0,707. Ou seja, será de aproximadamente 70%. |
1- 3 - Uma justificativa sob a ótica da análise combinatória Para justificar o problema pelo ponto de vista da análise combinatória, vamos focar nossa atenção em um problema mais simples. Especificamente, em um grupo de seis pessoas tomadas ao acaso, qual é a probabilidade P(C) de que pelo menos duas delas façam aniversário no mesmo dia do mês? Antes, porém, duas observações. Em primeiro lugar, o fato de que o modo mais simples de resolver o problema é pensar sob a perspectiva do evento complementar P(Cc), ou seja, calcular primeiramente a probabilidade de que não ocorram coincidências entre os dias de aniversário de cada um dos membros do grupo. Porém, é necessário que, ao final, nos lembremos que a probabilidade procurada é P(C) = 1 – P(Cc). A segunda observação diz respeito à razão que traduz o valor de P(Cc). Especificamente, |
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1- onde o número de casos favoráveis refere-se ao total de grupos de seis pessoas, cujos dias do aniversário não coincidem e; o número de possibilidades diz respeito ao total de grupos diferentes de seis pessoas que podemos formar, tendo por base o dia do mês que essas pessoas fazem aniversário. Em relação ao número total de possibilidades, como os dias do mês podem variar de 1 a 31, isso significa que existem, para nomear cada um dos membros do grupo, 31 possibilidades diferentes. Logo, pelo princípio fundamental da contagem, o número de possibilidades é igual a 316. |
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1- Quanto ao número de casos favoráveis, como o nosso interesse é para os casos em que não ocorram coincidências, para cada membro do grupo o número de opções de escolhas para o dia do aniversário será uma unidade menor do que o número de opções de escolhas oferecidas ao individuo anterior. Especificamente, enquanto para o indivíduo um existem 31 opções de escolha para o dia do aniversário, para o indivíduo dois teremos 30 opções e, assim, sucessivamente. Em suma, o número de casos favoráveis será dado pelo produto (31 x 30 x 29 x 28 x 27 x 26) ou, de modo mais específico, pelo arranjo simples de 31 elementos tomados 6 a 6. |
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1- Portanto, a probabilidade do evento complementar é |
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1- Logo, a probabilidade de que, em um grupo de seis pessoas escolhidas ao acaso, pelo menos duas delas façam aniversário no mesmo dia do mês é 1 – 0,597 = 0,403 ou, mais simplesmente, de aproximadamente 40%. Neste ponto, parece-nos relevante ressaltar que este exemplo, embora mais simples, nos possibilita visualizar uma possível razão pela qual, em um primeiro momento, o problema de coincidência das datas de aniversário se constitui, para a maioria das pessoas, como um paradoxo. Possivelmente, pelo fato de que a probabilidade de coincidência, conforme demonstra o gráfico abaixo, cresça de forma bastante acentuada. Note-se que, no caso específico de coincidência de aniversários no mesmo dia do mês, para um grupo de 13 pessoas ou mais, trata-se de um fenômeno que, em termos probabilísticos, pode ser considerado como evento certo. |
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1- Finalmente, em relação ao problema de interesse central – determinar o valor da probabilidade de que em um grupo de trinta pessoas, pelo menos duas delas aniversariem no mesmo dia do ano – a probabilidade, por analogia à solução do problema anterior, é |
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1- 4 - Algumas considerações Vimos que uma das possíveis causas pelas quais o problema das coincidências de aniversário se constitui, na perspectiva do senso comum, como um paradoxo, pode estar ligado ao fato dos fenômenos associados ao problema serem eventos de alta incidência probabilística. Contudo, parece-nos pertinente lembrar que, além disso; se de um lado, a solução teórica do problema não oferece maiores complicações, por outro lado, o mesmo não se verifica quando tentamos uma verificação numérica, mesmo considerando os recursos computacionais mais sofisticados, atualmente, à disposição do usuário comum de computadores. Como título de ilustração, considere o problema: qual é a probabilidade de que em um grupo de seis pessoas, pelo menos duas delas aniversariem no mesmo dia do ano? Sob a ótica da análise combinatória, segue, abaixo, o encaminhamento para a solução, bem como o valor da probabilidade procurada. |
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1- Note-se, que este exemplo nos dá bem a dimensão das dificuldades operatórias que permeiam a busca de uma referência numérica para a solução de problemas dessa natureza. Contudo, que não fiquem dúvidas. Para grupos de 40 pessoas ou mais, a probabilidade de coincidência é superior a 90%. Finalmente, tomando por base as justificativas apresentadas, não nos parece difícil ver que para um grupo de n pessoas, a probabilidade P(C) de que pelo menos duas delas façam aniversário no mesmo dia do ano, poderá ser calculada por pelo menos duas abordagens diferentes. Especificamente, |
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Leituras complementares |
Paradojas en la historia de la probabilidad como recurso didáctico. |
Fontes/ Referências Infográficas |
Biblioteca Científica LIFE. As Matemáticas. Editora José Olympio. Rio de Janeiro: 1964. |
GARDNER, M. Ah, apanhei-te!. (Coleção: O prazer da matemática V. 12.). Tradução: Jorge Lima. Gradiva - Publicações Ltda. Portugal,1993. |
Silva, J. F. S. Os paradoxos. On line in: http://www.projetozk.com/mais_um/02_paradoxos.html. Fevereiro 2013. |
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